COMO EVITAR MAIS MORTES COMO A DE DEMOITIÉ ?

O ciclista belga Antoine Demoitié faleceu no último domingo após sofrer uma queda durante  a Gent-Wevelgem, o motociclista que acompanhava o pelotão tentou frear, mas a moto acabou caindo sobre o ciclista. O team Wanty-Gobert para quem o ciclista corria diz que foi uma fatalidade. O mundo do pedal em estado de choque pede maior atenção, dirigentes estudam a possibilidade da redução de motos e veículos nas caravanas

 

Antoine Demoitié

Antoine Demoitié durante a pré-temporada

A culpa é de quem?  Cada vez mais patrocinadores querem e exigem exposição. Os meios de comunicação querem as melhores imagens, então coloquem cinegrafistas na moto1, moto2 e moto3 e mais um monte de fotógrafos – afinal tem os jornais, revistas, sites e blogs para serem abastecidos. Além desse pelotão de motos dos meios de comunicação estão as  motos com médicos e mecânicos. Nos carros não há mais espaço, além das viaturas das equipes estão os carros para o passeio dos Vips, o gerente do banco, o prefeito, o amigo do amigo e em meio a essa caravana, rodando à  frente muitas vezes um pelotão que pode chegar à casa dos 200 ciclistas. Não é fácil colocar ordem numa caravana dessas, corre-se constantemente sobre o fio da navalha.  As regras para conduzir e se movimentar na caravana existem, há exageros, imprudência, mas quando isso é uma fatalidade aonde se agarrar para não desmontar a própria estrutura de apoio do esporte: a caravana?

O ciclismo moderno chegou à sua própria encruzilhada: sem exposição, sem imagens  não há dinheiro. A garantia de bons patrocinadores tanto para equipes quanto para os organizadores de eventos  só é viável quando há imagens, quando há cobertura televisiva. A televisão, e a transmissão por internet são a vitrine para novos produtos, novas bicicletas e para tentar sempre aumentar a audiência e o número de fãs, sempre pensando em resultados e crescimento, quais serão os números, quanto rendeu a última edição para buscar uma melhor cotação de venda para a próxima.

Em uma modalidade que sempre vive na corda bamba quando se trata de verbas publicitárias, muitas vezes os 5 minutinhos da fuga ao vivo para todo o mundo são a sobrevida de uma  equipe. Uma transmissão para todos os continentes pode garantir ao organizador uma valorização da sua corrida, colocando-a em outro patamar.

No caso do acidente com o belga Antoine Demoitié a equipe trata  o caso como de um “trágico acidente” – uma fatalidade. Segundo o assessor de imprensa da equipe, José Been,  “Este é um trágico acidente com um motard (motocislita) que trabalha em provas do ciclismo belga a pelo menos 20 anos. Essa pessoa está muito afetada pelo que aconteceu, assim como todos nós. Não se trata de uma colisão em alta velocidade como foram os casos do Peter Sagan ou do Stig Broeckx. Este acidente foi uma fatalidade, o homem tentou freiar e caiu sobre Antoine”.

O acidente aconteceu em Sainte-Marie-Cappel quando ainda faltavam 115 km para a conclusão e o pelotão tocava a fronteira belgo-francesa,  segundo o jornalista holandês Sebastiaan Timmerman, trata-se de uma fatalidade. “Antoine Demoitié colidiu com outros ciclistas. Uma motocicleta oficial que rodava atrás deles tentou evitar o pelotão de ciclistas , mas a manobra deu errado. Ele caiu e o motor bateu em Demoitié”, ainda segundo o jornalista ao final da prova motociclista passou pela sala de imprensa: “Eu sei que o motard é um cara muito experiente. Quanto ele entrou na tenda aonde eu estava trabalhando, vi imediatamente que ele estava muito afetado pelo ocorrido. Ele veio até mim e perguntou se eu tinha notícias sobre o ciclista. Mas essas coisas não são comunicadas através da rádio” finalizou.

UCI e sindicato dos ciclistas profissionais dizem que acompanharão as investigações, não fazem nada mais do que a sua obrigação, mas quais as medidas que devem ser adotadas para evitar novos acidentes? Reduzir a caravana? E as motos o que fazer com elas, neste caso é importante destacar que o motociclista não era nenhum novato, uma pessoa com 20 anos de provas de ciclismo na Bélgica já sabe e tem o tempo do pelotão, sabe até antecipar ações, mas às vezes fatalidades acontecem, a questão é como evitá-las. Como colocar comissários e meios de comunicação longe da ação? É um esporte aonde os riscos são muitos, e aonde uma falha como aconteceu no domingo terminam em uma tragédia. O tombo de 4 ciclistas no pelotão, o motard que freia e a moto que acaba sobre o ciclista.

O presidente da Federação belga, Tom Van Damme admitiu: “Devemos nos perguntar se cada uma dessas motos que temos na corrida sejam realmente necessárias e se o comportamento de cada um é correto. Penso que sejam muitos veículos na corrida e com a UCI estamos empenhados em estudar a redução” e ainda comentou: “O ocorrido no domingo foi uma tragédia após um grande final de semana. Conheço o motociclista envolvido no acidente, sei que tem mais de 30 anos de experiência e é um dos pilotos mais confiáveis e prudentes. Temos que ficar atentos para não colocar mais lenha na fogueira”.

Van Damme ainda tentando manter uma posição de equilíbrio disse: “Entendo as reações dos ciclistas, obviamente um dos seus companheiros perdeu a vida. Mas não podemos crucificar o motociclista em questão, não estava fazendo nada de absurdo, pelo contrário, procurou fazer uma intervenção para proteger os ciclistas”.

Em meio à consternação, o ciclista britânico Daniel Martin deu uma declaração que merece ser levada muito em consideração: “Nos necessitamos das motos na corrida, seja pela nossa segurança, seja para dar possibilidade aos meios de comunicação para que eles contem a corrida. Mas é o comportamento na corrida que precisa ser melhorado. O pelotão atravessa muitas vezes estradas estreitas, e temos motos transitando a alta velocidade colocando em perigo a segurança de todos”

O que entristece nesse processo todo, além da perda de uma vida é a corrida banal pela informação, sim houve disso também: quem daria a notícia da morte primeiro, enquanto a maioria dos veículos de comunicação trabalhava com a notícia de um caso grave e muito delicado um certo site francês chegou ao requinte da crueldade ao anunciar a morte, depois corrigir o título e colocar “entre a vida e a morte”  com informações a serem confirmadas pela família.  O jornalismo nos tempos das redes sociais também foi contaminado pelo imediatismo. Segundo o blog especializado Le Ravito, certos jornalistas se deram ao requinte de em 10 minutos ligar 8 vezes a pessoas próximas ao ciclista, sem o mínimo de respeito pelo momento que essas pessoas estavam atravessando, em um vale tudo sem responsabilidade e sem o mínimo de respeito para sair com uma nota de falecimento à frente dos seus concorrentes.

Nos sonhos de Antoine Demoitié estava quem sabe um dia vencer uma clássica como a Ghent-Wevelgem e seguir os passos de Tom Boonen ou de Phillipe Gilbert. Em seu currículo uma vitória ao Tour de Finistère, uma etapa da Copa da França, além de um segundo lugar na Handzame Classic e no GP STad Zottegem. Na última Etoile de Bésseges, foi terceiro na primeira etapa. Os órgãos do ciclista foram doados, e salvaram a vida de três pessoas

O manager da equipe jean François Boulart relembrou o sonho e as conversas sobre Demoitié de correr as provas World Tour : “Na sexta-feira passada ele correu sua primeira prova World tour, a E3 Harelbek. Ele esteve na fuga do dia e subiu o Taaienberg com os melhores. Ele estava muito orgulhoso e nos  ficamos muito contentes. O domingo acontecu o inacreditável .

Um dos últimos a conversar com o ciclista foi o diretor esportivo da equipe, Hilaire van der Schueren:”Antoine me chamou pelo rádio para me pedir uma caramanholas, essas foram suas últimas palavras, entreue e fui para um segundo grupo. Pedi ao comissário para passar pelo grupo e então aconteceu tudo. Nosso mecânico foi o primeiro a ver Antoine e ele me chamou. Nesse momento pensei que o Antoine estava morto, massa a ambulância estava ali, o levaram ao hopistal. Tinha esperança  até o momento em que a organização me pediuo os dados para contatar a família. Então souve que era algo muito grave”, o diretor é uma das testemunhas na investigação que esta sendo feita pelas autoridades.

Com a tragédia não há o mínimo clima para a equipe belga entrar na estrada, de comum acordo ciclistas e direção abriram mão de largar nesta terça-feira do 3 Jour de la Panne e da Route Adelié e Paris-Camembert , voltando às competições somente no Tour de Flandres.

 

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